terça-feira, 29 de maio de 2012

"ESSES LOPES" - Guimarães Rosa

O conto “Esses Lopes “, do livro Tutaméia de João Guimarães Rosa, é objeto de análise desta comunicação que se utiliza da noção de formas de vida tal como a concebe a semiótica francesa, pressuposto metodológico do trabalho. No texto rosiano o sujeito da enunciação projeta um narrador, figurativizado por uma mulher já idosa, Flausina, que relata sua história de vida pretérita, possibilitando-nos acompanhar as transformações por que ela passou da adolescência à velhice. Tais transformações representam o estabelecimento de uma nova práxis sobre a forma de vida da mulher pobre do sertão que ela corporifica. Segundo Fontanille (1993), na apresentação do dossiê sobre as formas de vida, fruto de um seminário publicado na Recherches Sémiotiques, Semiotic Inquiry, a questão das formas de vida surge em semiótica em razão de dois tipos de preocupação. A primeira é relativa à práxis enunciativa, uma vez que as formas de vida se originam e se desfazem pelo uso, ou seja, são inventadas, praticadas ou denunciadas por instâncias enunciativas coletivas ou individuais. Quanto à segunda, de ordem estética, relaciona-se à estetização da ética, pois as formas de vida dão um sentido à existência somente se obedecerem a certos critérios de ordem sensível e estética. Ao analisar o “beau geste”, como forma de vida, Greimas (1993), nessa mesma publicação, afirma que as formas de vida se relacionam a uma nova “ideologia”, a uma “concepção de vida” que pode ser considerada simultaneamente uma filosofia de vida. O “beau geste”, segundo o autor, se coloca contra as formas socializadas do dever, anula o efeito de estabilidade, de fixidez, característico dessa modalidade. Assim, o sujeito tem a possibilidade de abrir-se para o devir, e, postando-se inversamente como sujeito de um possível querer, adquire a competência para tornar-se autônomo e auto-destinado. O semioticista lituano ressalta também que o “beau geste” é uma forma de afirmação do indivíduo em relação ao coletivo, e de uma moral pessoal em relação a uma moral social. No texto rosiano, verificaremos o modo como a protagonista da história, Flausina, denuncia uma forma de vida estereotipada, que legava à mulher um papel de marginalidade social, e inventa uma nova práxis, que passa a dar um sentido a sua vida, na medida em que se transforma de não sujeito em sujeito de sua própria história, de sujeito alienado em sujeito perceptivo.É importante notar que, em “Esses Lopes”, a filosofia de vida do homem do sertão mineiro prega a submissão feminina aos valores do universo patriarcal. Observaremos o modo como Flausina rompe com essa visão de mundo ao nível do ser, porém, ao nível do parecer, simula submeter-se a ela, e o enunciador possibilita ao enunciatário observar como ela se libertou de tais práticas sociais pré-estabelecidas. Assim, por meio de transformações que operou em sua vida, como sujeito pragmático, cognitivo e passional, o ator tornou-se sujeito de sua história. É, pois, com base, na noção de formas de vida que analisaremos as transformações sofridas pelo ator, como sujeito pragmático cognitivo e passional. Nossa hipótese é que o fazer estético da enunciação, aplicado à dimensão ética, ao chamar a atenção para o parecer sensível do ator do enunciado, pode levar a transformações na visão de mundo estereotipada do enunciatário e propor novas formas de vida .

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